O novo prazo de suspensão das execuções na Recuperação Judicial

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  1. Introdução

O presente artigo tem o objetivo de analisar as alterações promovidas pela Lei nº 14.112/2020 (Lei nova), em relação ao “stay period” – o período de suspensão das execuções na Recuperação Judicial.

  • “Stay period”

O deferimento do processamento do pedido de recuperação judicial acarreta a suspensão das execuções ajuizadas contra o devedor e sócios solidários, na forma do artigo 6º, II, c. c. § 4º, da Lei. Sendo que, este período é denominado “stay period” (expressão do Direito norte-americano).

A Lei nova de recuperação judicial permitiu uma prorrogação legal do prazo de suspensão das execuções de 180 (cento e oitenta) dias, totalizando, portanto, 360 (trezentos e sessenta) dias de suspensão das execuções individuais dos credores contra o devedor e sócios solidários.

Esse período de suspensão das execuções individuais é fundamental para que os credores e devedor possam negociar o plano de recuperação judicial, a fim de cumprir o objetivo do instituto, qual seja, recuperar a empresa em crise econômico-financeira para que continue a produzir e circular riquezas, gerar empregos e a arrecadação de tributos, incentivar a economia do País e pagar seus credores.

Tal objetivo não será alcançado se os credores continuarem com as execuções individuais buscando bens do devedor que, provavelmente, não poderá pagar todos os credores de forma integral ou no mínimo de forma parcial, podendo ser decretada a sua falência.

Reitera-se que, o intuito é recuperar a empresa em crise econômico-financeira e pagar os credores da melhor forma possível. Por isso, o deferimento do processamento do pedido de recuperação judicial do devedor acarreta a suspensão das execuções individuais dos credores.

Insta salientar-se que, não há prejuízo aos credores, porque a Lei também prevê que, o deferimento do processamento do pedido de recuperação judicial do devedor acarreta a suspensão da prescrição das obrigações do devedor (artigo 6º, I, c. c. § 4º, da Lei). Ou seja, os credores não perdem a pretensão de poder exigir seus créditos em juízo.

A Lei nova determinou, ainda, a proibição de qualquer forma de retenção, arresto, penhora, sequestro, busca e apreensão e constrição judicial ou extrajudicial sobre os bens do devedor, oriunda de demandas judiciais ou extrajudiciais, cujos créditos ou obrigações sujeitem-se à recuperação judicial (artigo 6º, III, c. c. § 4º, da Lei).

O objetivo da norma é impedir qualquer ato constritivo de bens do devedor de forma individual por determinados credores, fato que prejudica a recuperação judicial, pois se um ou mais credores obtiverem seu crédito com a alienação de algum ativo do devedor, poderá não sobrar o suficiente para atender a todos os credores, nem que o adimplemento ocorra de forma parcial.

A Lei nova acrescentou a proibição de qualquer forma de constrição judicial de bens do devedor porque, na prática, a partir da constrição no bojo de um processo de execução, o devedor ainda tinha que suscitar a questão da incompetência do juízo que realizou a constrição judicial, a fim de garantir a competência universal do juízo da recuperação judicial para decidir sobre a matéria.

Nesses casos, infinitas discussões jurídicas eram geradas, o que, por óbvio, postergava o plano de recuperação judicial e podia até acarretar a ausência de ativos do devedor, prejudicando os credores e acarretando a decretação de falência.

De outra sorte, são os processos que envolvam a discussão de quantias ilíquidas, que devem prosseguir para obter decisão judicial sobre a existência, liquidez e exigibilidade do crédito, porque apenas créditos líquidos podem ser habilitados na recuperação judicial.

Nesse contexto, estão inseridas, por exemplo, as reclamações trabalhistas que prosseguem na Justiça do Trabalho, que é a justiça com competência para decidir relações jurídicas decorrentes do contrato de trabalho. Apenas a sentença trabalhista poderá determinar a existência, liquidez e exigibilidade do crédito trabalhista que será habilitado na recuperação judicial.

Dessa forma, o deferimento do processamento do pedido de recuperação judicial do devedor, acarreta a suspensão das execuções em face do devedor e sócios solidários pelo prazo de 180 (cento e oitenta) dias, prorrogável uma vez, por igual período, totalizando 360 (trezentos e sessenta) dias para que o devedor elabore um plano de recuperação judicial efetivo para a superação da crise econômico-financeira e o pagamento dos credores.

Esclarece-se que, a partir da publicação da decisão que defere o processamento da recuperação judicial, o devedor tem o prazo improrrogável de 60 (sessenta) dias para apresentar o plano de recuperação (artigo 53, da Lei). Assim, o prazo de suspensão das execuções e constrições judiciais corre junto com o prazo do devedor para a apresentação do plano, o que possibilita a negociação com os credores.

A dilação do prazo de suspensão das execuções se dá em caráter excepcional, pois só poderá ser prorrogado se o devedor não houver concorrido para a superação do lapso temporal sem apresentar um plano de recuperação eficaz.

Insta salientar-se que, é fundamental que os credores participem da elaboração do plano de recuperação judicial com o devedor para que a efetividade ocorra no mundo dos fatos e não apenas na abstração da Lei.

Aliás, esse o objetivo da Lei nova, que prevê, ainda, a possibilidade de apresentação de plano alternativo de recuperação judicial pelos credores (artigo 6º, § 4º-A, da Lei).

Assim, decorrido o prazo de suspensão das execuções, sem a deliberação sobre o plano de recuperação judicial apresentado pelo devedor, a Lei nova faculta aos credores a apresentação de plano alternativo no prazo de 30 (trinta) dias. Caso os credores resolvam apresentar o plano alternativo, haverá um período adicional de 180 (cento e oitenta) dias de suspensão das execuções para permitir a efetividade da negociação e a preservação dos ativos (artigo 6º, § 4º-A, II, da Lei).

Ressalta-se que, a Lei nova tem o objetivo de proteger os ativos do devedor de constrições judiciais para permitir a continuidade da atividade empresarial e o pagamento de todos os credores.

Para tanto, a Lei nova prevê a suspensão das execuções individuais, a vedação de constrições judiciais sobre os bens do devedor e até a substituição de constrição judicial em execução fiscal que recaia sobre bens de capital essenciais à atividade empresarial do devedor (artigo 6º, § 7º-B, da Lei).

Suscita-se uma questão importante em torno dos “bens de capital essenciais à atividade empresarial do devedor” que, já foram considerados pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) como bens corpóreos, não perecíveis e não consumíveis.

Nesse conceito não está incluído o dinheiro – bem móvel e consumível -, ou seja, o próprio faturamento da empresa não é considerado “bem de capital essencial à atividade empresarial do devedor”, pelo STJ.

Contudo, a prática demonstra que o dinheiro é fundamental para a continuidade da atividade empresarial, sendo de rigor consolidar o entendimento da jurisprudência no sentido de considerar dinheiro como bem de capital essencial, a fim de preservar os objetivos da Lei nova. Caso contrário, não haverá ativos aptos a garantir a superação da crise econômico-financeira.

Destarte, as inovações promovidas pela Lei nova, entre as quais, a dilação do prazo de suspensão das execuções, a proibição de constrições judiciais, a possibilidade de apresentação de plano alternativo de recuperação judicial pelos credores, com a finalidade de implementar as atividades empresariais, estão em consonância com legislações modernas e, inclusive, com o princípio da livre iniciativa para as atividades empresariais, e serão aperfeiçoadas pela jurisprudência dos Tribunais pátrios, a fim de garantir o pagamento dos credores, a manutenção dos empregos e da própria economia do País.

*Photo by Pawel Chu on Unsplash

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