Recuperação judicial e a concursalidade dos honorários advocatícios devidos na justiça do trabalho.

Advogado com a mão próxima a livro de Direito

Entre as inovações trazidas pela reforma da CLT (Lei N° 13.467, de 13 de julho de 2017), encontra-se o arbitramento de honorários advocatícios em face da parte sucumbente (Artigo 791-A da CLT).

Comumente, os respectivos honorários, quando arbitrados, são cobrados nos próprios autos em que se processou a ação principal.

Todavia, tratando-se de ação trabalhista promovida em face de empresa que se encontra em recuperação judicial, a matéria ainda não está totalmente pacificada, havendo decisões que determinam a habilitação e o pagamento junto ao Juízo recuperacional, como, também, decisões que entendem que os honorários advocatícios devem ser objeto de cobrança extraconcursal, por tratar-se de verba fixada posteriormente ao pedido de recuperação judicial.

No que se refere aos créditos concursais, sabe-se que o art. 49, caput, da Lei n° 11.101/2005, estabelece que estão sujeitos à Recuperação Judicial não somente os créditos vencidos, mas também os vincendos, desde que seu fato constitutivo seja anterior ao ajuizamento do pedido.

Nesse contexto, sabe-se que a constituição do crédito de honorários sucumbenciais advém de sentença condenatória que fixou os valores devidos ao final do processo. De modo que, se a referida decisão que qualificou o nascimento do direito ao recebimento dos honorários advocatícios, deu-se em momento posterior ao pedido de Recuperação Judicial, há entendimentos que classificam tal crédito como extraconcursal e não sujeito aos efeitos da Recuperação Judicial, conforme já decidiu o C. STJ:

“PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL. HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS. SENTENÇA POSTERIOR AO PEDIDO DE RECUPERAÇÃO. NÃO SUJEIÇÃO DO CRÉDITO AOS EFEITOS DA RECUPERAÇÃO. 1. A jurisprudência do STJ é no sentido de que o crédito de honorários advocatícios sucumbenciais surgido posteriormente ao pedido de recuperação não pode integrar o plano, pois viola a literalidade da Lei n. 11.101/2005. Precedentes. 2. Recurso especial conhecido e desprovido. (RECURSO ESPECIAL Nº 1814137/RS, RELATORA MINISTRA NANCYANDRIGHI, Publicação no DJe/STJ nº 2881 de 01/04/2020)

“AGRAVO INTERNO NO CONFLITO DE COMPETÊNCIA. DEFERIMENTO DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL. NOVAÇÃO DO CRÉDITO. HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS DECORRENTES DA EXTINÇÃO DA AÇÃO DE COBRANÇA. SENTENÇA POSTERIOR AO PEDIDO DE RECUPERAÇÃO. NÃO SUJEIÇÃO DO CRÉDITO AOS EFEITOS DA RECUPERAÇÃO. CONTROLE DOS ATOS CONSTRITIVOS PELO JUÍZO UNIVERSAL. AGRAVO DESPROVIDO. 1. O direito (creditício) aos honorários advocatícios sucumbenciais surge por ocasião da prolação da sentença, como consequência do fato objetivo da derrota no processo, por imposição legal. Assim, não obstante o aludido crédito, surgido posteriormente ao pedido de recuperação, não possa integrar o plano, é vedada a expropriação de bens essenciais à atividade empresarial, na mesma linha do que entendia a jurisprudência quanto ao crédito fiscal, antes do advento da Lei n. 13.043/2014. Portanto, tal crédito não se sujeita ao plano de recuperação e as execuções prosseguem, porém o juízo universal deve exercer o controle sobre atos de constrição ou de expropriação patrimonial. 2. Agravo interno desprovido. (g.n.) (AgInt no CC 151.639/SP, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 25/10/2017, DJe 06/11/2017)

Sob este prisma, não haveria acessoriedade entre o crédito concursal do cliente do causídico e seus honorários advocatícios, isso porque os honorários estariam a constituir parcela autônoma do advogado pela prestação do serviço profissional, arbitramento judicial ou sucumbência fixada, conforme dispõe o art. 22 do Estatuto da OAB.

Assim, diante da suposta não sujeição do crédito decorrente dos honorários sucumbenciais aos efeitos da Recuperação Judicial, entendem alguns julgados que inexistem pressupostos para que ocorra a efetiva Habilitação de Crédito com relação ao Advogado interessado, que deverá buscar a satisfação de seus interesses, mediante ação autônoma.

Entretanto, há que se atentar para existência de opinião diversa sobre tal matéria, inclusive, amparada em reiteradas do próprio C. STJ.

Afinal, não se pode perder de vista, que a exemplo dos créditos trabalhistas a verba honorária advocatícia também guarda natureza alimentar.

Ressalte-se, ainda, que os honorários advocatícios na justiça do Trabalho, apesar de nascerem em momento posterior, decorrem naturalmente da sentença que impõe a procedência ou improcedência dos pedidos, tratando-se de verba acessória que só existe em razão da própria lide instaurada. De modo que, ausente a ação, ausente também os honorários sucumbenciais.

Sobre o assunto e em que pese a inegável autonomia entre o crédito trabalhista e o crédito decorrente de honorários advocatícios sucumbenciais, configura-se verdadeira incongruência a submissão do principal aos efeitos da Recuperação Judicial e a não sujeição da verba honorária.

Nesse sentido, também se posicionado o C. STJ, dada a similaridade com a verba trabalhista em geral, a possibilidade de habilitação da verba honorária no Quadro Geral de Credores, mesmo que a sua constituição tenha se dado após o pedido de Recuperação Judicial:

RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE DESPEJO E COBRANÇA DE ALUGUEIS. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS SUCUMBENCIAIS. NATUREZA ALIMENTAR. EQUIPARAÇÃO A CRÉDITOS TRABALHISTAS. SUJEIÇÃO À RECUPERAÇÃO JUDICIAL.

1- Os honorários advocatícios cobrados na presente ação não podem ser considerados créditos existentes à data do pedido de recuperação judicial, visto que nasceram de sentença prolatada em momento posterior. Essa circunstância, todavia, não é suficiente para exclui-los, automaticamente, das consequências da recuperação judicial.

2- O tratamento dispensado aos honorários advocatícios – no que refere à sujeição aos efeitos da recuperação judicial – deve ser o mesmo conferido aos créditos de origem trabalhista, em virtude de ambos ostentarem natureza alimentar.

3- O Estatuto da Advocacia, diploma legal anterior à atual Lei de Falência e Recuperação de Empresas, em seu art. 24, prevê a necessidade de habilitação dos créditos decorrentes de honorários advocatícios quando se tratar de processos de execução concursal. 4- Recurso especial conhecido e provido. (REsp 1377764/MS, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 20/08/2013, DJe 29/08/2013).

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. 1. ALEGAÇÃO DE DECISÃO EXTRA PETITA. SÚMULA N. 7 DO STJ. 2. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. VERBA DE CARÁTER ALIMENTAR. PEDIDO DE HABILITAÇÃO DE CRÉDITO CONSTITUÍDO APÓS O PEDIDO DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL. POSSIBILIDADE. SÚMULA N. 83 DO STJ. 3. AGRAVO INTERNO IMPROVIDO.

1. Reverter a conclusão do Tribunal local, para acolher a pretensão recursal quanto a existência de decisão extra petita, demandaria o revolvimento do acervo fático-probatório dos autos e a análise e interpretação de cláusulas contratuais, o que é vedado devido à natureza excepcional da via eleita, consoante enunciado da Súmula n. 7 do Superior Tribunal de Justiça.

2. O Tribunal estadual julgou a demanda em conformidade com o entendimento desta Corte no sentido de que deve ser dispensado tratamento isonômico a verbas que ostentam a mesma afinidade ontológica, sendo possível o pedido de habilitação de crédito dos honorários advocatícios sucumbenciais constituídos após o pedido de recuperação judicial. Incide, portanto, no caso a Súmula n. 83 do STJ.

3. Agravo interno improvido. (AgInt no AREsp 1381009/MS, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 20/05/2019, DJe 24/05/2019).

Tanto é verdadeiro tal argumento que, normalmente, são expedidas Certidões de Habilitação de Crédito em favor dos respectivos patronos, do principal e dos honorários advocatícios, justamente pelo fato destes serem acessórios à ação que deu ensejo ao crédito detido em seu favor.

Desta forma, se o crédito trabalhista é concursal, porque seu fato gerador é anterior ao pedido de Recuperação Judicial, a verba honorária sucumbencial deve seguir a mesma linha, dado que seu nascimento decorre do processo principal.

Isso ocorre, porque ambos os créditos possuem natureza alimentar, e o direito à verba honorária sobrevém do reconhecimento do direito ao crédito do empregado, não havendo razão, portanto, par se classificar o crédito do patrono como sendo extraconcursal.

Nesse passo, acerca da natureza alimentar do crédito de honorários advocatícios, o Supremo Tribunal Federal, no multicitado RE 470.407, relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Primeira Turma, julgado em 09/05/2006, definiu verbis:

CRÉDITO DE NATUREZA ALIMENTÍCIA – ARTIGO 100 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. A definição contida no § 1-A do artigo 100 da Constituição Federal, de crédito de natureza alimentícia, não é exaustiva. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS – NATUREZA – EXECUÇÃO CONTRA A FAZENDA. Conforme o disposto nos artigos 22 e 23 da Lei nº 8.906/94, os honorários advocatícios incluídos na condenação pertencem ao advogado, consubstanciando prestação alimentícia cuja satisfação pela Fazenda ocorre via precatório, observada ordem especial restrita aos créditos de natureza alimentícia, ficando afastado o parcelamento previsto no artigo 78 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, presente a Emenda Constitucional nº 30, de 2000. Precedentes: Recurso Extraordinário nº 146.318-0/SP, Segunda Turma, relator ministro Carlos Velloso, com acórdão publicado no Diário da Justiça de 4 de abril de 1997, e Recurso Extraordinário nº 170.220-6/SP, Segunda Turma, por mim relatado, com acórdão publicado no Diário da Justiça de 7 de agosto de 1998 (DJ de 13/10/2006).

Finalmente, não se pode perder de vista que a própria Lei de Falência e Recuperação de Empresas, em seus Artigos 84 e 149, estabelece a necessidade de habilitação dos créditos decorrentes de honorários advocatícios quando se tratar de processos de execução concursal, a exemplo do que já decidiu o C. STJ.

DIREITO PROCESSUAL CIVIL E EMPRESARIAL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. FALÊNCIA. HABILITAÇÃO. CRÉDITO DE NATUREZA ALIMENTAR. ART. 24 DA LEI N. 8.906/1994. EQUIPARAÇÃO A CRÉDITO TRABALHISTA.

1. Para efeito do art. 543-C do Código de Processo Civil: 1.1) Os créditos resultantes de honorários advocatícios têm natureza alimentar e equiparam-se aos trabalhistas para efeito de habilitação em falência, seja pela regência do Decreto-Lei n. 7.661/1945, seja pela forma prevista na Lei n. 11.101/2005, observado, neste último caso, o limite de valor previsto no artigo 83, inciso I, do referido Diploma legal. 1.2) São créditos extraconcursais os honorários de advogado resultantes de trabalhos prestados à massa falida, depois do decreto de falência, nos termos dos arts. 84 e 149 da Lei n. 11.101/2005.

2. Recurso especial provido. (STJ – REsp  Nº 1.152.218 – RS (2009/0156374-4) – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – Julgado em  07/05/2014 – Publicado DJe 08/10/2014).

Em síntese, em que pese a divergência jurisprudencial acima suscitada, verifica-se que o crédito decorrente de honorários advocatícios deve sujeitar-se aos efeitos da Recuperação Judicial, mesmo que arbitrado após o pedido recuperacional, dado a acessoriedade que encerra, bem como sua inegável natureza alimentar, suscetível de ser classificado na classe I, ou seja, como crédito derivado da legislação do trabalho ou decorrente de acidentes de trabalho.

Photo by Mojtaba Hoseini on Unsplash

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