Fato do Príncipe e a negativa de autorização do Governo Federal para os empresários adquirirem a vacina para imunizar os colaboradores

Homem sendo vacinado por uma enfermeira

Segundo matéria jornalística do Estadão, de titularidade de Fernando Scheller, editada em 14/01/2021, “o Governo Federal disse a empresários, em reunião virtual realizada ontem e promovida pela Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), que a aquisição de vacinas por empresas para imunização de funcionários será proibida, apurou o Jornal O Estado de S. Paulo.[1]

Segundo a matéria, “a vacinação ficará a cargo do governo, que garantiu ter imunizantes para toda a população.”

A indagação que se faz é a seguinte: por que não possibilitar aos empresários a antecipação da imunização de seus colaboradores, visando protegê-los do COVID-19, dando uma maior segurança a todos?

Estudos recentes demonstram a eficácia de vários fabricantes da vacina seja para imunizar, seja para não permitir a evolução da doença ou o agravamento dos sintomas.

A imunização dos funcionários de uma empresa, em princípio, pode reduzir em muito os riscos de contaminação, ou mesmo riscos da evolução do COVID-19, evitando-se assim, o afastamento dos colaboradores, notadamente aqueles já portadores de doenças crônicas ou idosos, ou seja, os mais vulneráveis.

Com a proibição do Governo Federal, avocando a responsabilidade pela imunização da população brasileira, bem como negando ao empresariado o direito de agir por sua conta, o Governo atrai para si a possibilidade de indenizar as rescisões que porventura poderão ocorrem em massa, por meio da aplicação da Teoria do fato do Príncipe (art. 486 da CLT).

O fato do Príncipe consiste na paralisação temporária ou definitiva do trabalho por conta da emissão de um ato de autoridade municipal, estadual ou federal, ou pela promulgação de lei ou resolução que impossibilite a continuação das atividades econômicas empresariais.

A proibição do Governo Federal ao empresariado na aquisição de doses da vacina para imunização dos colaboradores de uma empresa, nada mais é do que um ato governamental Federal, que veta a iniciativa privada de adquirir a vacina e imunizar os funcionários.

Nesse contexto, se enquadra exatamente na hipótese do artigo 486 da CLT (fato do Príncipe) e ainda na responsabilidade objetiva do Estado (art. 37, CRBF/88) alicerçada também no artigo 927 do Código Civil.

Como consequência, na hipótese de entidades privadas  manifestarem formalmente perante autoridades públicas Municipais, Estaduais ou Federal o interesse na aquisição particular/antecipada da vacina para imunização de seus colaboradores, quando negada a referida aquisição, vindo a colapsarem por conta de funcionários afetados pela COVID-19, pondo em risco o negócio a ponto de ter que demiti-los para suportar a continuidade do empreendimento, ou mesmo pondo término às atividades com o fechamento de sedes ou filiais, me parece justo a aplicação do artigo 486 da CLT para que o Ente Público arque com a “conta” dessas demissões.

Há quem dirá que não, pois o 29, lei 14.020/20 (proveniente da Medida Provisória nº 936/2020) elide a aplicação do artigo 486 da CLT para atos de autoridade no enfrentamento do estado de calamidade pública decorrente da crise sanitária do Corona Vírus.

Porém, até sob essa ótica deve-se indagar: a proibição de aquisição de doses da vacina pelo particular que busca imunizar seus colaboradores seria um ato de autoridade pública que visou o enfretamento do COVID-19 ou uma medida que vai contra o enfrentamento? Na segunda hipótese, que se revela mais racional, não se aplicaria o artigo 29 da Lei 14.020/20, pois o ato de proibir a aquisição pelos empresários para imunização dos colaboradores vai contra sua própria redação/literalidade e a finalidade da norma (mens legis) e ainda contra o maior princípio Constitucional: a dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, CRFB/88) e o direito à Saúde (dever do Estado).

Portanto, dadas as considerações acima, ao nosso sentir, para aqueles empresários que manifestaram, formalizarem e oficializaram interesse de aquisição de doses da vacina perante autoridades Públicas Municipais, Estaduais e Federal, visando a imunização antecipada dos seus colaboradores no âmbito empresarial, que tiverem o pleito negado e sofrerem os impactos do COVID-19 sobre os colaboradores, resultando na demissão de funcionários, seja no empreendimento principal ou filiais, abre-se a possibilidade de aplicar o artigo 486 da CLT, visto a negativa governamental para a citada aquisição antecipada dos imunizantes, sendo possível que as demissões sejam arcadas pela autoridade que proibiu as aquisições, afastando-se a hipótese da ressalva do artigo 29 da Lei 14.020/20, já que a negativa não se justificaria como ato de enfrentamento da crise sanitária.


[1] https://economia.uol.com.br/noticias/estadao-conteudo/2021/01/14/governo-diz-a-empresarios-que-comprar-vacina-para-funcionarios-sera-proibido.htm

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