Majoração de honorários em caso de recurso (ou “Honorários Recursais”).

Pilha de 3 livros ao lado de agenda e caneta

Como sabemos, a Reforma Trabalhista ampliou, no sistema processual trabalhista, a possibilidade de condenação em honorários sucumbenciais, antes restrita às hipóteses em que o reclamante estivesse assistido por sindicato e desde que recebesse menos de 2 (dois) salários-mínimos. Era o que definia a Lei n. 5584, de 26 de junho de 1970.

O art. 791-A da CLT reproduziu em alguns aspectos as normas do CPC (nominalmente os artigos 85 e 98), silenciando a respeito de outras e suscitando, assim, questionamentos acerca de sua aplicabilidade à luz do art. 769 da CLT. Sem dúvidas, é um debate que acaba por refletir na atuação do operador do direito trabalhista.

Sem dúvidas, um dos dispositivos do CPC de aplicação mais controversa na Justiça do Trabalho é o §11 do art. 85, o qual prevê que “[o] tribunal, ao julgar recurso, majorará os honorários fixados anteriormente levando em conta o trabalho adicional realizado em grau recursal, observando, conforme o caso, o disposto nos §§ 2º a 6º (…)”.

O que esse parágrafo prevê, em suma, é a premiação do trabalho adicional do advogado, em casos de recurso onde haja manutenção de algum dos capítulos da sentença, com o desprovimento ou não conhecimento do recurso.

O texto legal determina, ainda, que os honorários recursais, no cômputo geral, não poderão ultrapassar os patamares mínimo e máximo de honorários advocatícios (respectivamente, 10 a 20% no CPC – ou 1 a 20%, em condenações contra a Fazenda Pública, conforme as alíquotas estabelecidas em parágrafo próprio -, e 5 a 15%, na CLT).

Naturalmente, quando houver provimento do recurso, não será o caso de majoração dos honorários, mas sim de inversão dos ônus sucumbenciais – ou seja, a parte que inicialmente deveria pagar honorários deixa de ter essa obrigação, enquanto a parte que sucumbiu no recurso passa a ser devedora de honorários aos advogados da primeira.

Muito se tem debatido acerca do cabimento desse instituto à Justiça do Trabalho, notadamente pela omissão voluntária do texto legal no assunto. Supõe-se ser voluntária a omissão porque, tanto o novo CPC quanto a Reforma Trabalhista, foram concebidos pela mesma legislatura do Congresso Nacional.

Por certo, sua eventual aplicação seria restrita aos patamares que a CLT prevê, quais sejam, o mínimo de 5% e o máximo de 15% “sobre o valor que resultar da liquidação da sentença, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa”. Quanto a isso, não há grande controvérsia.

Por outro lado, muito se discute se (a) os honorários recursais seriam, de fato, aplicáveis ao processo do trabalho, (b) se sim, quais seriam os critérios e regras aplicáveis, e (c) se haveria discricionariedade ou obrigatoriedade na sua aplicação.

Para se ter uma noção da divergência e efervescência do assunto, apenas entre setembro e outubro de 2020 dois Tribunais Regionais do Trabalho dentro do mesmo Estado (da 2ª e da 15ª regiões) julgaram de maneira diametralmente oposta a questão.

O Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região entende que, tendo havido regulamentação específica pela Reforma Trabalhista, não haveria que se aplicar a majoração dos honorários no processo do trabalho (fato que alguns acórdãos do Tribunal chamam, ainda, de “silêncio eloquente”):

“HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA RECURSAIS. NÃO CABIMENTO NO PROCESSO DO TRABALHO. Com a reforma da CLT advinda da Lei 13.467/17, houve regulamentação específica dos honorários sucumbenciais pelo art. 791-A, sem a previsão de sua majoração pela mera atuação em grau recursal. Nessa linha, o art. 85, §11 do CPC não é aplicável ao processo do trabalho.”[1]

Filiam-se a esse entendimento os TRT’s da 10ª[2] e da 12ª[3] regiões.

Já o Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região entende que não só é aplicável a majoração dos honorários na Justiça do Trabalho, como também tal instituto se coloca de maneira compulsória e independentemente de requerimento do interessado, bastando para tanto o “trabalho adicional realizado em grau recursal”:

“HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS RECURSAIS. PROCESSO DO TRABALHO. CPC, ART. 85, § 11 DO CPC. MAJORAÇÃO DE OFÍCIO É cabível a majoração dos honorários recursais no processo do trabalho, desde que o recurso tenha causado ao advogado da parte contrária “trabalho adicional realizado em grau recursal”, observado o teto de 15%. Tal majoração passa a ser obrigação da instância “ad quem”, devendo ser decretada independentemente de requerimento do recorrido, pois a norma conjugou o verbo no tempo imperativo (“majorará”). Honorários advocatícios majorados para 10%.”[4] (grifos nossos)

Filiado a esse posicionamento há, por exemplo, o TRT da 18ª Região[5].

O STF vai além, ao entender que a majoração prescinde também de um trabalho efetivo da parte recorrida:

“(…) o fato de não ter apresentado contrarrazões não necessariamente significa que não houve trabalho do advogado: pode ter pedido audiência, ter apresentado memoriais. Em última análise, como eu considero que essa medida é procrastinatória e que a majoração de honorários se destina a desestimular também essa litigância procrastinatória”[6].

Como se vê, o STF estabelece uma finalidade secundária para a majoração dos honorários em sede de recurso: o desestímulo à interposição de recursos meramente protelatórios. Em linha com esse entendimento, também, o STJ[7].

Ainda na seara da jurisprudência do Supremo, há a premissa de que “o direito aos honorários advocatícios sucumbenciais surge no instante da prolação da sentença. Se tal crédito não era previsto no ordenamento jurídico nesse momento processual, não cabe sua estipulação com base em lei posterior, sob pena de ofensa ao princípio da irretroatividade da lei”[8] (grifos nossos).

O raciocínio é praticamente de dedução: se quando não há honorários advocatícios em primeiro grau, não há majoração de honorários, do contrário (ou seja, havendo a condenação em honorários), deverá haver a majoração.

Comentando esta decisão, André Pagani de Souza assume a possibilidade de aplicação deste dispositivo ao processo do trabalho:

“No caso concreto, o recorrente pedia, em sede recursal, o arbitramento de honorários de sucumbência recursal com base no § 11 do art. 85 do CPC/2015. Porém, o art. 791-A, da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), introduzido pela Lei n. 13.467/2017 (“Reforma Trabalhista”), que estabelece os honorários de sucumbência nas reclamações trabalhistas, não estava em vigor na época em que foi proferida a decisão recorrida e, portanto, não foram fixados na origem. Assim, decidiu o Supremo Tribunal de Federal – em harmonia com o que já havia decidido o Superior Tribunal de Justiça – que não é possível fixar honorários sucumbenciais recursais se não houve arbitramento de honorários de sucumbência na decisão recorrida.”[9] (grifos nossos)

Frise-se que esse novo instituto (“honorários recursais” ou simplesmente “majoração de honorários”) visa premiar o trabalho adicional do advogado da parte em virtude de um recurso. Premiar o trabalho é compatível com os princípios do processo do trabalho, principalmente após a entrada em vigor do art. 791-A da CLT, que prevê expressamente o pagamento de honorários advocatícios pela parte sucumbente.

Por sua vez, o TST vem adotando um posicionamento intermediário, orientando-se pela aplicabilidade da norma ao processo do trabalho, mas facultativa a cada Tribunal Regional:

“5. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. VALOR ARBITRADO. MAJORAÇÃO. O valor arbitrado aos honorários advocatícios foi fixado com observância do art. 85, § 2º, do CPC e da Súmula 219/TST (mínimo de dez e o máximo de vinte por cento sobre o valor da condenação). A majoração do percentual prevista no art. 85, § 11, do CPC é faculdade do Regional, que examinará cada caso em concreto. Ausente a prova de que a valoração foi equivocada, não há que se cogitar de violação do preceito de lei em questão. Agravo de instrumento conhecido e desprovido”[10] (grifos nossos).

Contudo, tanto pela ementa quanto pelo voto condutor, identificamos uma premissa equivocada na análise realizada pelo Tribunal: a de que a alteração do valor de honorários seria um tópico de mérito do recurso, visando desconstruir ou alterar os critérios utilizados na instância inferior para estipulação do percentual; entretanto, a mens legis orienta-se no sentido de serem os honorários advocatícios um acessório à condenação, nos moldes dos juros e da correção monetária.

Com efeito, prevê o art. 322, §1º do CPC: “[c]ompreendem-se no principal os juros legais, a correção monetária e as verbas de sucumbência, inclusive os honorários advocatícios”.

Ou seja, se quando da petição inicial já se compreendem feitos os pedidos de juros, correção monetária e honorários sucumbenciais, pode-se igualmente afirmar que quando do recurso estará, automaticamente, incluído o pedido de majoração dos honorários. Daí o entendimento do TRT-15, visto acima, prever inclusive que os honorários recursais prescindem de pedido específico pela parte recorrente.

Naturalmente, é legítimo o recurso que pleiteie pura e simplesmente a alteração dos honorários advocatícios por reputá-los insuficientes, injustos, desproporcionais etc. Porém, considerando a existência do instituto dos honorários recursais, é necessário distinguir muito bem entre um e outro, a fim de garantir a precisão conceitual e, consequentemente, o viés adequado na análise do recurso pelo órgão ad quem.

Além do mais, esse julgado do TST entende que a majoração dos honorários seria facultativa, não obrigatória, o que não se pode depreender da norma legal: “[o] tribunal, ao julgar recurso, majorará os honorários fixados anteriormente” (grifos nossos) – o verbo, ao prever a ação que ocorrerá como consequência do julgamento do recurso, não abre margem para que os tribunais decidam de modo diverso.

Ainda analisando a redação, sob o ponto de vista do ato administrativo, quer nos parecer ser essa majoração um ato administrativo vinculado (ou seja, o contrário de discricionário), “porque a lei não deixou opções; ela estabelece que, diante de determinados requisitos, a Administração deve agir de tal ou qual forma”[11].

Os únicos requisitos legais para a majoração, no caso, são que o tribunal em questão julgue o recurso e respeite, no cômputo geral, o determinado nos parágrafos 2º (critérios de estipulação em geral) e 3º (critérios específicos envolvendo condenação da Administração Pública) do art. 85 do CPC.

Acerca desse dispositivo, afirma a doutrina processualista civil:

“A fixação de verba honorária nos recursos é uma importante e relevante inovação trazida pelo CPC/2015, cabendo ao órgão julgador fixar o valor dos honorários considerando o trabalho apresentado pelo patrono em sede recursal. Não se trata de faculdade do órgão julgador fixar a sucumbência recursal, mas sim dever decorrente de lei.

(…) A modificação trazida pelo CPC/2015, especialmente no § 11 do art. 85, alterou a sistemática anterior, pois agora o tribunal, ao julgar o recurso interposto, ficará obrigado a majorar o valor dos honorários fixado anteriormente, independentemente de recurso de apelação para discussão da verba honorária, tudo de maneira a remunerar o trabalho desenvolvido pelo advogado em sede recursal.”[12] (grifos nossos)

Poder-se-ia argumentar que a facultatividade da majoração é uma adaptação da Justiça do Trabalho, de forma a tornar o instituto compatível com as nuances do processo do trabalho? Não, porque não há razão para o afastamento da plena incidência desse instituto, uma vez que premiar o trabalho adicional do advogado é perfeitamente compatível com esse ramo do Direito.

Ademais, com a novel obrigação legal de se liquidar os valores da inicial (art. 840, §1º da CLT) e a própria previsão de honorários sucumbenciais (art. 791-A), claramente se objetiva a diminuição de pedidos infundados, sendo tal raciocínio perfeitamente extensível à interposição de recursos.

Desse modo, a apresentação de recurso somente se dará em caso de flagrante injustiça, ou, então, para postergar a realização da justiça – caso em que haverá uma reprimenda correspondente, com a majoração dos honorários advocatícios inicialmente estipulados.


[1] TRT-2 – RO 1000617-14.2019.5.02.0351, Rel. Des. Raquel Gabbai de Oliveira, 14ª Turma, p. 10.10.2020.

[2] TRT-10 – RO 0000725-22.2018.5.10.0012, Rel. Antonio Umberto de Souza Júnior, 3ª Turma , j. 17.07.2019.

[3] TRT-12 – EMBDECCV 0000671-59.2019.5.12.0014, Rel. Gracio Ricardo Barboza Petrone, 4ª Câmara, j. 12.06.2020.

[4] TRT-15 – RO 0010251-17.2019.5.15.0019, Rel. Samuel Hugo Lima, 5ª Câmara, p. 10.09.2020.

[5] TRT-18 – RO 0011076-22+2019.5.18.0004, Rel. Eugenio José Cesario Rosa, 2ª Turma, j. 20.07.2020.

[6] ARE 964.330 AgR/ES, Rel. para acórdão Roberto Barroso, 1ª Turma do STF, j. em 30.08.2016.

[7] STJ. 3ª Turma. AgInt no AREsp 370.579/RJ, Rel. Min. João Otávio de Noronha, j. em 23.06.2016.

[8] STF, ARE 1014675 AGR / MG, rel. Min. Alexandre de Moraes, 1ª Turma, j. 23.03.2018.

[9] SOUZA, André P. de. Honorários sucumbenciais recursais e a recente decisão do STF. Disponível em: <https://www.migalhas.com.br/CPCnaPratica/116,MI278680,101048-Honorarios+ sucumbenciais+recursais+e+a+recente+decisao+do+STF>, acesso em 17.02.2021, às 13h58.

[10] AIRR-1251-37.2017.5.12.0054, 3ª Turma, Relator Ministro Alberto Luiz Bresciani de Fontan Pereira, DEJT 02.10.2020.

[11]  DI PIETRO, Maria S. Z. Direito Administrativo. São Paulo: Atlas, 2012. 25ª ed. p. 219.

[12] CURY, Renato J. apud TUCCI, José R (org.). Código de Processo Civil Anotado. Ano 2018. p. 157.

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