“O PETISCO”
Acompanhei um determinado caso concreto no qual o autor, após matar a vítima, dirigiu-se à sua residência, pegou uma faca de serra, voltou novamente ao local do crime, esquartejou a vítima e cortou suas orelhas. No outro dia, enquanto bebia aguardente, faltou o famoso “petisco”. Pois bem, o denunciado assou as orelhas da vítima e comeu-as, ou seja, usou-as como “petisco”, como “tira-gosto”. Cruel, não? Você, como Promotor, denunciaria o autor, incluindo a qualificadora do meio cruel?
Resposta. Para a sua surpresa,não. A crueldade realizada após a consumação é exaurimento e, neste caso, caracteriza-se outro crime, qual seja, vilipêndio a cadáver, art. 212, in verbis:
Vilipendiar cadáver ou suas cinzas:
Pena – detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa.
Dizia Frederico Marques: “os atos que podem traduzir a crueldade somente são tais, como é óbvio, enquanto a pessoa está com vida. Não há, pois, perversidade brutal ou crueldade naquele que, depois de abater e matar a vítima, lhe mutila o cadáver ou lhe esquarteja o corpo para melhor fazer desaparecer os rastros do crime”.
Nesse mesmo sentido defende Cleber Masson: “Não incide a qualificadora quando o meio cruel é empregado após a morte da vítima, pois a crueldade que caracteriza a qualificadora é somente aquela utilizada para matar. O uso de meio cruel após a morte caracteriza, em regra, o crime de homicídio (simples ou com outra qualificadora, que não a do meio cruel), em concurso com o crime de destruição, total ou parcial, de cadáver (CP, art. 211)”.