Suicídio e trabalho – setembro amarelo

Mulher usando mão como arma apontada na cabeça

INTRODUÇÃO

Setembro é o mês da prevenção ao suicídio, conhecido como Setembro Amarelo. Porém, um aspecto que pouco se comenta é a relação que o trabalho tem com os índices de suicídio.

Em tempos de instabilidade econômica e crise em diversos setores, os ânimos ficam mais exaltados, acompanhados da insegurança e do temor de ficar sem trabalho. Esse temor pode fazer com que empregados, das mais diversas hierarquias, se submetam a condições de trabalho que não lhes fazem bem. Por exemplo, podem aceitar horas extras sem pagamento, trabalhar aos finais de semana sem o descanso compensatório, aceitar sobrecargas que roubam convívio social e espaço para o fortalecimento de outros aspectos da vida e, até mesmo, aceitar humilhações, agressões e o assédio moral. O cansaço decorrente dessa tensão e angústia deixa tais trabalhadores vulneráveis para o adoecimento mental. Em decorrência disso, os índices desse tipo de adoecimento têm crescido ultimamente, assim como os afastamentos do trabalho por questões de saúde mental, conforme revelam pesquisas e estudos atuais.

Apesar de tudo isso, a questão do suicídio relacionado ao trabalho ainda é um tema tabu e pouco falado. Na realidade, quando se fala de saúde mental, muito se fala de questões individuais e pouco se fala de questões sociais e do trabalho.

Daí a importância e o nosso interesse em elaborar esse breve estudo sobre o tema do suicídio no trabalho.

A IMPORTÂNCIA DO TRABALHO NA NOSSA SOCIEDADE ATUAL

Vivemos em uma sociedade na qual o trabalho é fundamental. É através do trabalho que garantimos nossa sobrevivência. É através do trabalho – não como ferramenta de transformação do mundo, mas de produtividade – que somos socialmente valorizados. É através do trabalho, também, que muitos de nós transformamos e construímos nossas identidades.

Estar excluído do trabalho é estar à margem de uma sociedade que deposita seu valor, precipuamente, naquilo e no quanto você produz, em valores econômicos. Assim, quem trabalha vive sob a angústia da possibilidade de perder seu emprego, seu sustento, seu valor social. Quem não tem emprego, por outro lado, tem ainda mais um medo: o de não ter a sua subsistência garantida.

Todo esse contexto, agravado na atualidade em razão da crise econômica decorrente da pandemia do Covid-19, acarreta em grande pressão no ambiente laboral. Isso produz sensações de isolamento e de permanente desconfiança e tensão, além de nos levar a ignorar os nossos limites, para nos demonstrarmos importantes, úteis e necessários aos nossos locais de trabalho.

Em locais de trabalho nos quais a produção é medida por equipe, podemos passar a ser vigias e carrascos uns dos outros, temendo que o mal desempenho de um colega nos afete.  Acima de tudo, essa competitividade exacerbada dificulta ou impede que nos unamos para lutar contra trabalhos massacrantes.

Nesse cenário, trabalhos que poderiam nos dar prazer e orgulho podem, por vezes, perder o seu sabor. A vida pode se tornar acelerada, cansativa, solitária e sem sentido. Somada a esse contexto uma cultura que exalta a excelência e o valor por produção e que atribui resultados a fatores individuais, como personalidade e capacidade, podemos nos sentir fracos, incapazes, inadequados, preferindo calar a admitir a suposta fraqueza.

Fadigados pela sobrecarga, pela tensão, desconfiança, solidão e angústia, podemos ficar vulneráveis para o adoecimento mental. Não é à toa que os índices desse tipo de adoecimento só têm crescido, bem como os afastamentos do trabalho por questões de saúde mental.

O AMBIENTE DE TRABALHO ADOECIDO

De acordo com os dados da pasta federal, as notificações de transtornos mentais relacionados ao trabalho passaram de 122, em 2007, para 8.621 em 2017 – 60% das pessoas acometidas são mulheres, e 40%, homens. (https://www.metropoles.com/brasil/saude-br/disturbios-no-trabalho-estimulam-tentativas-de-suicidio-2)

Enfim, estudos da Coordenação Nacional de Saúde do Trabalhador, do extinto Ministério do Trabalho, demonstram que o índice de tentativa de suicídios é maior em alguns tipos de trabalho, categorias e vínculos trabalhistas, tais como: motoristas de ônibus urbano, gerente de agência, professor de jovens e adultos do ensino fundamental (primeira a quarta série), gerente de contas (pessoa física e jurídica), cobrador de transportes coletivos (exceto trem), técnico de enfermagem, vigilante, agente comunitário de saúde, agente administrativo, faxineiro. (https://www.metropoles.com/brasil/saude-br/disturbios-no-trabalho-estimulam-tentativas-de-suicidio-2)

Além disso, o assédio organizacional, quando existente, é cruel, porque prioriza os resultados, enquanto que as consequências para saúde do trabalhador pouco importam.

ASSÉDIO, TRABALHO E SUICÍDIO

Se por um lado a pressão no trabalho pode levar a maior eficiência individual e gerar mais lucros para as empresas, por outro lado pode impor angústia e sofrimento ao trabalhador, resultando em quadros de depressão e até suicídio.

Estudos recentes têm levado especialistas a considerarem alguns suicídios relacionados à área do trabalho, mesmo quando o episódio acontece fora do ambiente laboral. 

Nem sempre é possível distinguir um suicídio ligado ao trabalho de um suicídio devido a outras causas, mas há casos em que é indiscutível que o que está em causa é o trabalho.

Estudos revelam que quando as pessoas se matam no local de trabalho, é muito provável que o trabalho esteja na causa. Quando o suicídio acontece fora do local de trabalho e a pessoa deixa cartas, um diário, onde explica por que se suicida, também é bem provável que o trabalho esteja na causa. Porém, quando as pessoas se suicidam fora do local do trabalho e não deixam uma nota, é muito complicado fazer a distinção.

É comum, ainda, a argumentação no sentido de que os suicídios de empregados têm a ver com a vida privada do mesmo e não com o trabalho. De fato, todos temos problemas pessoais. Portanto, quando alguém diz que uma pessoa se suicidou por razões pessoais, pode não estar errado. Se procurarmos bem, poderemos acabar por encontrar, em muitos casos, sinais precursores, sinais de fragilidade. Há quem já tenha estado doente, há quem tenha tido episódios depressivos no passado. Por isso, é preciso fazer uma investigação muito aprofundada, caso a caso.

PRECISAMOS FALAR DO ASSUNTO

De maneira geral, o suicídio em ambiente de trabalho ainda é um assunto pouco abordado. Talvez justamente por causa disso, suas taxas têm crescido em todo o mundo.

Estudo publicado no British Journal of Psychiatry concluiu que 10.000 pessoas se mataram entre 2008 e 2010 nos Estados Unidos e na Europa por conta da crise econômica. Segundo os últimos dados disponíveis para o mercado norte-americano, 270 pessoas cometeram suicídio no trabalho em 2013, um aumento de 12% em relação ao ano anterior.

De acordo com pesquisa baseada nos dados de 2003 a 2010 do Bureau of Census Labor Statistics dos Estados Unidos e publicada no American Journal of Preventive Health, os homens são 15 vezes mais propensos a se matar no trabalho do que as mulheres. E embora as estatísticas da OMS indiquem que há maior concentração de suicídios na juventude, este estudo mostrou que, em ambiente de trabalho, homens e mulheres entre as idades de 65 e 74 têm quase três vezes mais probabilidades de se matar do que pessoas de outras idades.

No Brasil, dados do Ministério da Saúde de 2014 mostram que naquele ano foram mais de 10.600 casos de suicídio no país. Em 2012, o Pais ocupava o oitavo lugar no ranking global de suicídios da Organização Mundial de Saúde. Todavia, não é possível saber quantos foram em ambiente de trabalho.

Segundo OMS – Organização Mundial de Saúde, em todo o mundo, o suicídio responde por 800 mil mortes por ano, ou uma a cada 40 segundos. É a principal causa de morte entre garotas na faixa dos 15 aos 29 anos em todo o mundo. A cada 4 suicídios, 3 acontecem em países de renda baixa ou MÉDIA.

O Setembro Amarelo é, portanto, uma ótima oportunidade para falar e conscientizar a sociedade sobre o assunto.

CONCLUSÃO

Dada a importância do tema desse breve estudo, precisamos compreender a relação entre o suicídio e o trabalho, isso para que possamos transformar essas situações produtoras de tanto sofrimento. Precisamos reconhecer as armadilhas nas quais somos colocados e procurar caminhos para nos livrarmos delas.

Precisamos compreender que não estamos adoecendo por sermos fracos, incapazes ou inadequados, mas porque nossos trabalhos, muitas vezes, estão sendo pensados e feitos de modo a nos adoecer.

Precisamos lutar por saudáveis condições sociais e laborais, para que pessoas possam ter outras saídas desses cenários que não a morte.

Ouvidorias, ou o setor de Recursos Humanos, nas empresas, em permanente contato com os adoecidos e com os médicos do trabalho, parecem ser uma boa opção, tanto para mapear como para acolher trabalhadores em busca de ajuda.

Outra medida importante parece ser a adoção de políticas de identificação e apoio a dependentes químicos e pessoas com depressão. Embora não haja uma relação direta entre drogas, depressão e suicídio, estes podem ser sinais de um comportamento autodestrutivo que eventualmente pode desembocar em atos mais radicais.

É positivo, ainda, procurar o auxílio de psicólogos clínicos, pois não é necessário, e muito menos recomendável, enfrentar esse problema sozinho.

FONTES DE PESQUISA:

https://epocanegocios.globo.com/Carreira/noticia/2018/03/ambiente-de-trabalho-toxico-e-5-maior-causa-de-morte-nos-eua-diz-professor-de-stanford.html

https://exame.abril.com.br/carreira/a-relacao-entre-suicidio-e-trabalho/

https://www.terra.com.br/noticias/dino/suicidio-em-ambiente-de-trabalho-ainda-e-subestimado,330598c255edeb22652227e78d26da5c7wsa340y.html

https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/busca?q=SUIC%C3%8DDIO+DE+EMPREGADO

https://www.metropoles.com/brasil/saude-br/disturbios-no-trabalho-estimulam-tentativas-de-suicidio-2

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