Diante do cenário crítico da pandemia no Brasil, em que vários municípios/estados alcançaram o estágio de risco, foi publicada em 26/03/21 a lei n. 14.128[1]. Em apertada síntese, ela dispõe sobre a compensação financeira que a União pagará a profissionais e trabalhadores de saúde que venham a ficar permanentemente incapacitados para o trabalho como também da possibilidade de dispensa do atestado médico durante o período de emergência de saúde pública no país.
Este artigo se limitará a abordar sobre os parágrafos 4º e 5º do art. 6º desta lei[2] trazendo à discussão: período permitido a não entrega de documento que justifique a ausência do empregado, quais seriam os documentos válidos para a justificativa de ausência e lacunas trazidas.
Em um primeiro momento é importante destacar que a redação da referida lei vem sendo muito criticada por ter sido, tecnicamente, mal redigida, não sendo clara e por permitir algumas interpretações, podendo, inclusive, levar problemas trabalhistas para as empresas.
Se depreende da análise desses parágrafos que enquanto durar o período de emergência em saúde pública devido à Covid-19, caso o funcionário estiver com suspeita de Covid[3], deve comunicar à empresa e não comparecer ao trabalho. A lei dispõe que, nesse caso, o funcionário está dispensado da entrega do atestado médico por até sete dias. Dentro desses 7 dias, o empregado deve permanecer em isolamento total, estando obrigado a fazê-lo todo aquele que teve contato com alguém com Covid ou esteja com suspeita de estar.
Essa determinação do parágrafo anterior, muito provavelmente, surgiu em decorrência da lotação nos hospitais e postos de saúde (pois como se não bastasse o aumento da procura por força da pandemia, os empregados acabavam indo de imediato em busca de atendimento médico com a finalidade de obter o atestado) e da dificuldade em se conseguir realizar o exame de RT-PCR no SUS (a lei é silente sobre quem pagaria o exame). Esse quadro acarretava indagações aos empregadores de como lidar com a preservação da saúde ocupacional dos seus colaboradores e, ao mesmo tempo, enfrentar as ausências no trabalho. Nesse último caso, era comum a dúvida no setor de Recursos Humanos se seria possível o desconto desses dias em que o empregado tinha a suspeita de ter sido contagiado ou ter tido contato com alguém o qual obteve a confirmação do contágio (ou até se deveria realizar esse desconto).
Sabe-se que a lei n. 605/1949[4] já dispunha no seu art. 6º que as faltas de qualquer empregado deveriam ser comprovadas e justificadas para que não houvesse o respectivo desconto dos dias ausentes. Diz ainda que, em caso de enfermidade, a falta deveria ser justificada por meio de atestado médico. Em suma: somente o atestado médico justificaria tal ausência e evitaria descontos. Por outro lado, é preciso se verificar o período totalmente atípico ocasionado pela pandemia. Em muitos casos, tem que se ponderar os riscos de o funcionário sair de casa em busca de atendimento médico e de realizar os testes, pois, além de expô-lo ao possível contágio, pode gerar impactos financeiros na empresa e na sociedade.
Destaca-se que o isolamento mencionado na lei não é opcional, estando tanto o empregador, quanto o empregado, obrigados a cumpri-lo pois o intuito é evitar o contágio e propagação do vírus. É o que a lei chama de “imposição ao isolamento”, bastando somente que o empregado tenha tido contato com alguém contagiado ou tenha suspeita de que esteja contagiado.
Na hipótese da confirmação do contágio, o empregado deve seguir rigorosamente as orientações médicas e sanitárias. Tendo sido negativo o exame, o funcionário está obrigado a apresentar no oitavo dia pelo menos uma declaração de atendimento no SUS (não necessariamente um atestado médico) ou a apresentação de um documento eletrônico do Ministério da Saúde[5] de maneira a justificar as faltas.
Como se nota, o funcionário é obrigado, em qualquer das hipóteses, a comparecer a uma unidade de saúde. Há estudiosos que entendem que se pode interpretar que é imposto ao empregado nos primeiros sete dias o isolamento, mas não está evidente que seja obrigatório a ida ao profissional médico e realização do teste RT-PCR. Ao nosso sentir, não existe margem para essa interpretação de liberalidade do empregado em ir ou não à unidade de saúde.
É aventada também a hipótese de, no caso de falta justificada, não se descontaria o DSR do salário do funcionário e, assim, ele receberia integralmente. Por outro lado, há quem diga que não será devido salário desses dias em que o empregado esteve ausente por julgar não ser justo que esse “peso” fique somente com o empregador. Nós ficamos com a primeira hipótese pois o texto da lei traz sobre a possibilidade de justificativa das faltas. Se há justificativa, não há no que se falar em descontos.
Outro ponto muito discutido desde a vigência da lei é que foi deixada uma lacuna por não informar quem pagará pelo teste do Covid. Sabe-se que, em alguns locais, o exame não é ofertado para todos e com a urgência necessária, restando a procura na rede privada. O que é possível afirmar é que se a lei não menciona, a empresa não está obrigada a tal, mas também não pode permitir que o funcionário retorne sem a apresentação do teste negativo. Inclusive, comprova a boa-fé do empregado.
Por fim, não resta dúvidas de que se o atestado não for entregue, o empregado pode realizar o teletrabalho, a não ser que a função seja incompatível. Isso porque a imposição ao afastamento do ambiente de trabalho pela suspeita de contágio, não significa que o funcionário esteja impedido de trabalhar. Somente o atestado médico é que justificaria a possibilidade de não trabalhar.
Mesmo havendo algumas lacunas as quais ensejam margem a múltiplas interpretações, o fato de a lei apontar a documentação válida e determinar um período para que o funcionário tenha tempo para providenciá-la e de modo mais seguro, contribui para a sua eficácia e saúde e segurança do trabalho, apesar de ter faltado uma redação bem redigida tecnicamente.
[1] Disponível em: https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/lei-n-14.128-de-26-de-marco-de-2021-310838371. Acesso em: 31 ago 2021.
[2] Conf: art 6º
§ 4º Durante período de emergência em saúde pública decorrente da Covid-19, a imposição de isolamento dispensará o empregado da comprovação de doença por 7 (sete) dias.
§ 5º No caso de imposição de isolamento em razão da Covid-19, o trabalhador poderá apresentar como justificativa válida, no oitavo dia de afastamento, além do disposto neste artigo, documento de unidade de saúde do Sistema Único de Saúde (SUS) ou documento eletrônico regulamentado pelo Ministério da Saúde.”(NR)
[3] A Portaria Conjunta n. 20/20 a qual estabelece as medidas a serem observadas visando à prevenção, controle e mitigação dos riscos de transmissão da COVID-19 nos ambientes de trabalho, 2.2 Considera-se caso suspeito o trabalhador que apresente quadro respiratório agudo com um ou mais dos sinais ou sintomas: febre, tosse, dor de garganta, coriza e falta de ar, sendo que outros sintomas também podem estar presentes, tais como dores musculares, cansaço ou fadiga, congestão nasal, perda do olfato ou paladar e diarreia.
2.3 Considera-se contatante de caso confirmado da COVID-19 o trabalhador assintomático que teve contato com o caso confirmado da COVID-19, entre dois dias antes e quatorze dias após o início dos sinais ou sintomas ou da confirmação laboratorial, em uma das situações abaixo:
a) ter contato durante mais de quinze minutos a menos de um metro de distância;
b) permanecer a menos de um metro de distância durante transporte;
c) compartilhar o mesmo ambiente domiciliar; ou
d) ser profissional de saúde ou outra pessoa que cuide diretamente de um caso da COVID-19, ou trabalhador de laboratório que manipule amostras de um caso da COVID-19 sem a proteção recomendada.
2.4 Considera-se contatante de caso suspeito da COVID-19 o trabalhador assintomático que teve contato com caso suspeito da COVID-19, entre dois dias antes e quatorze dias após o início dos sintomas do caso, em uma das situações abaixo:
a) ter contato durante mais de quinze minutos a menos de um metro de distância;
b) permanecer a menos de um metro de distância durante transporte;
c) compartilhar o mesmo ambiente domiciliar; ou
d) ser profissional de saúde ou outra pessoa que cuide diretamente de um caso da COVID-19, ou trabalhador de laboratório que manipule amostras de um caso da COVID-19 sem a proteção recomendada.
[4] Art. 6º Não será devida a remuneração quando, sem motivo justificado, o empregado não tiver trabalhado durante toda a semana anterior, cumprindo integralmente o seu horário de trabalho.
§ 1º São motivos justificados:
a) os previstos no artigo 473 e seu parágrafo único da Consolidação das Leis do Trabalho;
b) a ausência do empregado devidamente justificada, a critério da administração do estabelecimento;
c) a paralisação do serviço nos dias em que, por conveniência do empregador, não tenha havido trabalho;
d) a ausência do empregado, até três dias consecutivos, em virtude do seu casamento;
e) a falta ao serviço com fundamento na lei sobre acidente do trabalho;
f) a doença do empregado, devidamente comprovada.
§ 2º A doença será comprovada mediante atestado de médico da instituição de previdência social a que estiver filiado o empregado, e, na falta deste e sucessivamente, de médico do Serviço Social do Comércio ou da indústria; de médico da empresa ou por ela designado; de médico a serviço de repartição federal, estadual ou municipal, incumbida de assuntos de higiene ou de saúde pública; ou não existindo estes, na localidade em que trabalhar, de médico de sua escolha. (Redação dada pela Lei nº 2.761, de 26/04/1956). (Grifo Nosso).
[5] Portaria n. 356/2020 do Ministério da Saúde – anexo I. Disponível em: https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/portaria-n-356-de-11-de-marco-de-2020-247538346. Acesso em: 31 mar 2021.
O patrão pode descontar os dias de afastamento mediante a um atestado medico sendo que o exame seja negativo
Se há atestado médico, não é permitido o desconto pois mesmo negativo, foi necessário o isolamento para não correr o risco de contagiar outras pessoas como colegas de trabalho. Essa semana saiu uma portaria clara sobre isso.
Meu filho menor, fez exame RT PCR numa instituição privada em que o resultado sairá em 5 dias úteis, sou obrigada a fazer o exame na rede pública que oferece teste rápido?!?
A empresa pode exigir além do atestado com Cid indicando Covid ,podem exigir o exame junto também?
Tive que faltar para realizar o exame de Covid e deu positivo então não fui trabalhar, e só consegui atestado no dia seguinte… Esse dia que faltei por conta do exame que positivou, pode ser descontado? Ou o teste pode servir de justificativa para abonar a falta?